sexta-feira, 3 de abril de 2020


Compartilho uma reflexão  sobre o "Jejum do Bozo, do amigo teólogo da PUC Rio, Paulo Fernando Andrade, que autorizou a divulgação.



                      O Capitão convoca o povo para jejuar domingo. E chama também o povo para ir para as ruas rompendo a quarentena para a economia continuar funcionando, para que o povo continue a sustentar com suas vidas a riqueza de uns poucos. Os incita a sair, os envia para a morte. Para ele e para os que convocam este jejum a vida do pobre não importa, não tem valor nenhum.
Este jejum ofende a Deus. Sua convocação é um sacrilégio.
Lembremos as Palavras do Profeta Isaías:

"- De que serve jejuar, se com isso não vos importais? E mortificar-nos, se nisso não prestais atenção? É que no dia de vosso jejum, só cuidais de vossos negócios, e oprimis todos os vossos operários.

- Passais vosso jejum em disputas e altercações, ferindo com o punho o pobre. Não é jejuando assim que fareis chegar lá em cima vossa voz.

- Sabeis qual é o jejum que eu aprecio? - diz o Senhor Deus: É romper as cadeias injustas, desatar as cordas do jugo, mandar embora livres os oprimidos, e quebrar toda espécie de jugo". (Isaías 58:3-6)

segunda-feira, 4 de novembro de 2019

Religião e Poder: a Fé influencia no voto?





Religião e Poder: a Fé influencia no voto?[1]
Rodrigo Marzano Antunes Miranda[2]

Este assunto tem se mostrado cada vez mais presente no debate político local, porém é recorrente a divergência sobre a influência que as crenças, organizadas pelas igrejas têm nas escolhas dos eleitores efetivamente.
Com dinâmica rarefeita os 5.561 municípios de todo o país, expressam bem esta pauta, pois a opção religiosa e os valores morais são claramente atrelados a diferentes grupos. Mais o resultado das últimas campanhas eleitorais, deixa evidente o peso da religião nas escolhas do eleitor.
A questão central, para onde devemos direcionar nossas atenções, é o chamado o 'voto do fiel', principalmente no que diz respeito a ascensão política dos evangélicos, de diversas denominações, principalmente de cunho pentecostal. A pauta política nos últimos tempos se mostra impregnada por questões direcionadas principalmente pela atuação da Igreja, a saber, questões que pesaram, como nunca no último pleito: 1. a manutenção a todo custo da família tradicional; 2. aborto e gênero; 3. e é claro corrupção. 
Estes temas foram o grande mote eleitoral.[3] Tais igrejas acumularam um capital político que não pode mais ser ignorado. É uma presença consolidada e irreversível. 
Nossa estratégia e análise do cenário local, deve passar pelos valores morais e pela expansão da sociedade de consumo, pois este dois fatores, estão no cerne do 'voto evangélico'.
O voto em candidatos conservadores atrelados à religião se dá muito mais por conta da identificação com um sistema de valores morais do que a opção religiosa em si. Estamos falando de pessoas, que não se mostram, são quase que invisíveis no dia a dia. Se localizam nas periferias e não se sentem protegidas pelo Estado; encontram em 'Deus' tal proteção. A dificuldade para o acesso a bens de consumo também colabora, para que encontrem refúgio seguro na religião. Muitas vezes, a Igreja substitui o Estado até mesmo do ponto de vista material, dando ao Cristão/Cidadão direito a bens primários, trabalhando na mente das pessoas suas necessidades mais básicas, como alimento. Durante os governos sociais (Lula e Dilma), estas populações foram bombardeadas pelo discurso neopentecostal que 'Deus proverá' e a ascensão social de muitos foi atrelada a este discurso, fazendo com que as pessoas acreditassem que a melhora de vida foi resultado de seus esforços pessoais e de proveniência divina, não de politicas sociais.   
É inegável, esta maior presença da agenda pentecostal no debate eleitoral como algo natural. Trata-se, no entanto, de um cenário de maior pluralismo e diversidade de forças políticas. É mais um grupo, com sua bancada, seus representantes e interesses. As pessoas cada vez mais atinam para necessidade de se sentirem representadas. 
 O que precisamos sem dúvida saber diferenciar é que há mais forças entrando em jogo, é natural. Agora, uma coisa é o cenário político duradouro, outra bem diferente é o processo de eleição.
Cada vez mais o eleitor está decidindo seus candidatos porque eles se associam a determinadas religiões e mesmo que pesquisas não tenham conseguido determinar uma relação clara entre religião e sucesso nas urnas, é cada mais vez recorrente a associação de candidatos a forças religiosas.
A distribuição do apoio aos candidatos, aponta ainda discrepâncias entre os evangélicos pentecostais, que, em muitas situações, mostram posições divergentes e apesar da busca por apoio em diferentes grupos religiosos, é justamente entre os pentecostais que a disputa política de maior destaque se concentra, já que eles formam o grupo mais numeroso e poderoso dentro do universo evangélico, com cerca de cinco igrejas dominando o cenário: Universal, Assembleia de Deus, Renascer e Mundial do Poder de Deus.[4]
Não por acaso agora temos expressivo posicionamento na Câmara dos da chamada 'bancada evangélica': 1. questões relacionadas a costumes e à moral, defesa da ética e da vida humana, além daquelas afetas à honra da família são as que geralmente unem a bancada evangélica. Descriminalização do aborto, regulamentação da união civil homoafetiva e pesquisas com células-tronco são temas emblemáticos sobre os quais os membros da bancada atuam de forma coordenada. 2. a bancada atuou com unidade e fechou questão, por exemplo, nas deliberações sobre a Lei de Biossegurança, posicionando-se contrariamente à clonagem humana e à manipulação de embriões humanos e 3. o projeto que criminaliza a homofobia também coloca em lados opostos os membros da bancada evangélica e os deputados identificados com as questões de direitos humanos.[5]

Agora este cenário revela um projeto de poder?
O teólogo da PUC-Rio, Paulo Fernando Carneiro Andrade, em 2011, já apontava: 
As eleições (...) no Brasil trouxeram novas e urgentes questões em torno à articulação entre fé e política. (...) Habitualmente justificavam sua posição evocando Lc 20,25: “Pois bem, dai a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus” em uma leitura descontextualizada. (...) agora ninguém parece mais colocar em questão a relevância social da Fé Cristã e a necessidade de articular Fé e Política. Surge, porém, uma outra questão. Esta articulação tem sido algumas vezes feita de modo selvagem, em uma transposição direta, sem mediações, de uma esfera a outra. Sem dúvida a articulação entre Fé e Política é uma necessidade seja para a Fé, seja para a Política, porém nem toda articulação entre Fé e Política é legítima. Diante disto, a nova agenda da Pastoral Social e Política não deve ser mais o debate sobre a necessidade desta articulação, mas sobre o modo como esta relação deve se dar, legitimamente, em uma sociedade democrática, respeitando o que é próprio da Fé e o que é próprio da Política, evitando instrumentalizações nocivas à Fé e à Política.[6]

Apesar das diferenças sobre o impacto religioso de forma geral, temos que afirmar, que as igrejas evangélicas estão consolidadas como uma força política com a qual todos os partidos precisam negociar.
A penetração de grupos religiosos na esfera pública nacional, por meio de canais de televisão, tem aumentado exponencialmente. Logo, só o discurso religioso não é suficiente para ganhar novos adeptos, e se essa tendência já vinha se manifestando desde a década de 1990, ela atinge seu boom agora com a eleição presidencial de 2018, pois, a tendência identificada é de uma expansão da base de fiéis evangélicos, mesmo que em quantidade e não em qualidade, e maior penetração dessas igrejas e seus representantes na política brasileira.[7]
Portanto pode ser um exagero falarmos em um 'projeto de poder', mas fica claro um claro o 'projeto de participação mais intenso no sistema político brasileiro, colocando suas demandas'.
Medir a força da religião no processo eleitoral, é prematuro, mas que ela está mais presente do que no passado, é um fato inquestionável. Como isso vai se dar, se vai ser um fator de influência decisivo, só poderemos observar com o tempo.
Fica clara esta influência, na eleição de conselheiros Tutelares deste ano, pois, Política e religião não deveriam ser determinantes na escolha dos conselheiros tutelares, cuja missão primordial é defender os direitos de crianças e dos adolescentes com a necessária autonomia. Apesar disso, (...) a influência de figuras políticas e/ou de lideranças religiosas é marcante na disputa.[8]


 Portanto, devemos atentar para estes fatores: religião e política, pois: 
Quando se quer articular a Fé e o agir político torna-se, nessa perspectiva, imprescindível, manter o duplo olhar. De um lado o olhar Teológico sobre as escrituras e a Tradição, na qual e através da qual nos é transmitida a Palavra do Deus Vivo. De outro, o olhar das ciências sociais e humanas que nos permitem compreender de forma mais aprofundada o mundo, rejeitando a tentação de quer impor, por qualquer meio a Verdade a todos. É deste modo que a Igreja pode de fato contribuir para a Evangelização do mundo, colocando-se a serviço da Vida e da Justiça.[9]

Temos que informar, e mais que isso formar as pessoas, acerca desta correlação (Fé e Política) e faze-las atentar para o fato de que, muitos deturpam esta correlação com intuito de chegar ao poder. 
Não podemos aceitar, de forma alguma, que alguns líderes religiosos se aproveitem da boa fé de seus fiéis, que sequer são seus seguidores na realidade, para conseguirem um mandato político.[10] E a grande pergunta, que fica é a seguinte: Será que é válido conseguir o voto das pessoas a partir de sua crença? Pois: 
A eleição que interessa a Deus é de cunho espiritual e envolve a escolha de seus eleitos para seguir um evangelho puro e simples, que promova edificação de caráter, e não a degradação moral e a afronta à dignidade humana.[11]

Tais questões não são fáceis de serem respondidas e qualquer resposta seria, meio que incompleta, pois a peculiaridade de cada caso é que vai definir a licitude ou ilicitude de um líder religioso quando do seu contato com seus fiéis quando das eleições e o abuso de poder religioso visa à obtenção do voto. Isto, pode se manifestar de diferente maneiras, que acabam por manipular psicologicamente o eleitor através dos ensinamentos ou doutrinas da religião. Em alguns casos extremos, até mesmo promessas impossíveis são feitas para se alcançar o voto pela crença religiosa dos fiéis.[12]

Bibliografia utilizada: 

1.           ANDRADE, Paulo Fernando Carneiro. Fé, Política e Democracia. Novos desafios. In: <http://www.cefep.org.br/fe-politica-e-democracia-novos-desafios-paulo-fernando-carneiro-de-andrade/>. Acesso em: 28 Otu. 2019.
2.           BARBOSA, Fernando. Fé no voto. Em um país em que 90% têm alguma religião, ela pode fazer a diferença na urna. (DO UOL, EM SÃO PAULO). In: <https://www.uol/eleicoes/especiais/politica-e-religiao.htm#fe-no-voto>. Acesso em: 28 Otu. 2019.

3.           CHAPOLA, Ricardo. Religião e política: na eleição de 2018 e em outras disputas. (01 Set. 2018). NEXO JORNAL LTDA. In: <https://www.nexojornal.com.br/expresso/2018/09/01/Religião-e-pol%C3%ADtica-na-eleição-de-2018-e-em-outras-disputas>. Acesso em: 28 Otu. 2019.

4.           CORREIA, Débora Britto e Mariama. Política e religião influenciam eleições dos conselheiros tutelares. (MARCO ZERO). Em EM 27/09/2019. In: <https://marcozero.org/politica-e-religiao-influenciam-eleicoes-dos-conselheiros-tutelares/>. Acesso em: 28 Otu. 2019.

5.           CUTRIM, Mirla Regina da Silva. ABUSO DO PODER RELIGIOSO – Nova figura no direito eleitoral. In: <http://novoeleitoral.com/index.php/artigos/outrosautores/559-abuso-poder-religioso>. Acesso em: 28 Otu. 2019.

6.           NASSIF, Lourdes. Eleições 2018: bancada evangélica cresce na Câmara e no Senado. In: <https://jornalggn.com.br/congresso/eleicoes-2018-bancada-evangelica-cresce-na-camara-e-no-senado/>. Acesso em: 28 Otu. 2019.

7.           SAMPAIO JUNIOR, José Herval. O abuso de poder religioso nas eleições tem o mesmo mal dos demais! (JUSBRASIL). In: <https://joseherval.jusbrasil.com.br/artigos/438187557/o-abuso-de-poder-religioso-nas-eleicoes-tem-o-mesmo-mal-dos-demais>. Acesso em: 28 Otu. 2019.




[1] A BBC Brasil ouviu especialistas para tentar dimensionar as relações entre a religião e o voto do brasileiro em 2016 a beira das eleições presidenciais. Usaremos a leitura de tal pesquisa para fazer apontamentos sobre esta nova conjuntura. 
[2] Graduado em Filosofia (bacharel licenciado) PUC-MG (2005), especializado em Formação Política (lato sensu) PUC-RJ (2007), mestre em Direito pela UFMG (2019), doutorando do Programa de pós-graduação em Cidadania e Direitos Humanos, da Universitat de Barcelona (UB), na Catalunha, junto à Facultad de Filosofia (UB 2019-), orientado pelo Prof. Dr. Gonçal Mayos Solsona. Hoje é membro de dois grupos de pesquisa: o Grupo de Pesquisa dos Seminários Hegelianos (UFMG) e o Grupo internacional de Pesquisa em Cultura, História e Estado (UFMG-UB), sócio efetivo colaborador da Sociedade Hegel Brasileira e membro do grupo de pesquisa “Direitos Humanos: raízes e asas” (UFMG). Cf.: http://lattes.cnpq.br/8767343237031091.
[3] O último censo do IBGE, apontou um crescimento de 15,4% para 22,2% da população evangélica no Brasil entre 2000 e 2010.
[4] Levantamento do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP), órgão de assessoria parlamentar dos sindicatos brasileiros, demonstra, que a bancada evangélica que emergiu das urnas em 2018 apresenta aumento, em comparação com o pleito anterior (2014). Foram eleitos ou reeleitos 84 deputados identificados com as demandas, crenças e convicções deste segmento de interesse informal e suprapartidário na Câmara Federal. Em 2014, levantamento do DIAP identificou 75 deputados. Em 2010, a bancada iniciou os trabalhos legislativos com 73 representantes. O DIAP classifica como integrante da bancada evangélica, além dos que ocupam cargos nas estruturas das instituições religiosas — como bispos, pastores, missionários e sacerdotes — e dos cantores de música gospel, aquele parlamentar que professa a fé segundo a doutrina evangélica ou que se alinha ao grupo em votações de temas específicos.
[5] NASSIF, Lourdes. Eleições 2018: bancada evangélica cresce na Câmara e no Senado. In: <https://jornalggn.com.br/congresso/eleicoes-2018-bancada-evangelica-cresce-na-camara-e-no-senado/>. Acesso em: 28 Otu. 2019.
[6] ANDRADE, Paulo Fernando Carneiro. Fé, Política e Democracia. Novos desafios. In: <http://www.cefep.org.br/fe-politica-e-democracia-novos-desafios-paulo-fernando-carneiro-de-andrade/>. Acesso em: 28 Otu. 2019. p. 1. 
[7] BARBOSA, Fernando. Fé no voto. Em um país em que 90% têm alguma religião, ela pode fazer a diferença na urna. (DO UOL, EM SÃO PAULO). In: <https://www.uol/eleicoes/especiais/politica-e-religiao.htm#fe-no-voto>. Acesso em: 28 Otu. 2019.
[8] CORREIA, Débora Britto e Mariama. Política e religião influenciam eleições dos conselheiros tutelares. (MARCO ZERO). Em EM 27/09/2019. In: <https://marcozero.org/politica-e-religiao-influenciam-eleicoes-dos-conselheiros-tutelares/>. Acesso em: 28 Otu. 2019.
[9] ANDRADE, Paulo Fernando Carneiro. Fé, Política e Democracia. Novos desafios. In: <http://www.cefep.org.br/fe-politica-e-democracia-novos-desafios-paulo-fernando-carneiro-de-andrade/>. Acesso em: 28 Otu. 2019. p. 21. 
[10] SAMPAIO JUNIOR, José Herval. O abuso de poder religioso nas eleições tem o mesmo mal dos demais! (JUSBRASIL). In: <https://joseherval.jusbrasil.com.br/artigos/438187557/o-abuso-de-poder-religioso-nas-eleicoes-tem-o-mesmo-mal-dos-demais>. Acesso em: 28 Otu. 2019.
[11] CUTRIM, Mirla Regina da Silva. ABUSO DO PODER RELIGIOSO – Nova figura no direito eleitoral. In: <http://novoeleitoral.com/index.php/artigos/outrosautores/559-abuso-poder-religioso>. Acesso em: 28 Otu. 2019.
[12] CHAPOLA, Ricardo. Religião e política: na eleição de 2018 e em outras disputas. (01 Set. 2018). NEXO JORNAL LTDA. In: <https://www.nexojornal.com.br/expresso/2018/09/01/Religião-e-pol%C3%ADtica-na-eleição-de-2018-e-em-outras-disputas>. Acesso em: 28 Otu. 2019.

quinta-feira, 24 de outubro de 2019

“Sexualidade humana nas memórias de Santo Agostinho: dignidade e construção Cristã do Ocidente”.


“Sexualidade humana nas memórias de Santo Agostinho:

 dignidade e construção Cristã do Ocidente”.






Rodrigo Marzano Antunes Miranda[1]

Resumo: 
Este é complemento escrito de apresentação oral no I Simpósio Internacional de Filosofia da Dignidade Humana. Versa sobre Santo Agostinho, este “grande” que se confessa – no duplo sentido que o latim confere a este termo: confessar a própria miséria e confessar a grandeza da misericórdia divina – afirma com convicção que: “Não, a felicidade não é um corpo e por isso não se vê com olhos”. [2]As paixões às quais, Agostinho se entregou na juventude são ilusórias. Deus é o único “ser” que pode saciar as exigências do espírito humano para ele.
            Sobre tal problemática, no analisar e contextualizar que Agostinho, sendo antes de tudo um dos maiores arquitetos do projeto intelectual da Igreja Católica, trouxe com tais afirmações, uma certa “culpabilização” que define o teor do cristianismo católico no ocidente pelos séculos seguintes. Ao menos na maneira como foi interpretado pelos comentaristas medievais. O presente artigo tem o objetivo de traçar diretrizes que relacionem o pensamento cristão acerca da sexualidade humana, com a construção de um dos princípios constitucionais mais importantes da era moderna: o princípio da dignidade da pessoa humana. 


Palavras-chave: Sexualidade, Santo Agostinho, dignidade da pessoa humana, Ocidente.

1. INTRODUÇÃO

            Dos valores atualmente positivados na Constituição Federal de 1988, o mais relevante é, indubitavelmente, o princípio da dignidade da pessoa humana.[3]         




“Ao insistir na função propiciadora, finalmente, a ética ficou reduzida à pura genitalidade, como se a excitação venérea constituísse a única fonte possível de pecado. Os manuais só se ocupam desse aspecto, e inclusive, quando faziam referência a outras ações, analisava-se exclusivamente o perigo mais ou menos remoto que tinham de provocar reação genital e a causa mais ou menos justificante que pudesse existir a aceitação desse risco.” [4]

            Este é o grande risco que corremos ao lermos Santo Agostinho com os olhos da modernidade. Por isso evidenciar, sob o prisma de uma abordagem histórica de sua obra, a construção de valores acerca da sexualidade humana de maneira especifica – para o mundo ocidental – antigo e suas interpretações na Idade Média. Evidenciando isto, dedico-me a explanar as principais idéias de Santo Agostinho acerca da sexualidade.
Centralizo meus esforços na obra mais ilustre de Santo Agostinho: Confissões em seus livros de I – IX. Esta abordagem justifica-se no cap. II, de meu trabalho monográfico de conclusão de curso, da Faculdade de filosofia.
Como todo processo cognitivo, a construção deste princípio se deu majoritariamente pela desenvoltura da história, desde os tempos da Antiguidade até a Era Moderna.
Podemos citar o pensamento cristão da Idade Média (assim considerado o período entre os séculos V e XV d.C.) como sendo de extrema importância para a concepção do termo dignidade. É com o cristianismo que a noção de dignidade da pessoa humana se mistura com conceitos como alma, livre arbítrio e espírito.
Por esta razão, a dignidade do homem não está fundamentada no materialismo, mas sim nesta “imagem e semelhança” que o homem e a mulher têm com Deus. É nesta realidade que se cifra, ontologicamente[5], a dignidade humana.
A doutrina cristã prega até hoje que a alma é algo nobre e imutável, uma energia divina dada a cada um de nós por Deus, de uma forma que os seres humanos possam usar o corpo de uma forma livre, criando uma noção de livre-arbítrio. São inúmeras as relações que estes conceitos (livre arbítrio, alma, espírito) detêm com a noção contemporânea de dignidade e liberdade.
A pessoa humana é digna pelo mero fato de ser um indivíduo da espécie humana, e por deter uma alma dada por Deus. Portanto, só pelo fato de pertencer à natureza humana, todo homem, em qualquer situação que se encontre, é em si mesmo digno e merecedor de respeito.
Pelo fato de serem homens, todos aproveitam das mesmas garantias: direito à vida, à honra, à liberdade, a condições de existência minimamente condizentes com a realidade, ao trabalho, à família, etc.; e tudo que atenta contra essas garantias mostra-se contrário à dignidade humana.
No pensamento estritamente cristão, a dignidade é conceito advindo da relação do homem com Deus, e não por características pessoais, méritos ou circunstancias que o rodeiam. Sobre isto, afirma Mora Calvo (2004, p. 91), comentando o Papa João Paulo II:

“A dignidade humana vem de Deus, de sermos suas criaturas, e esta se aperfeiçoa e atualiza, e assim se corrobora na construção que esta criatura faz de um mundo cada vez mais digno e justo, cada vez mais proporcional e adequado a essa semelhança natural e transcendente de quem o confere tão elevada dignidade”[6]

2. CONSTATAÇÕES HISTÓRICAS ACERCA DA MORALIDADE CRISTÃ PARA O OCIDENTE ANTIGO

2.1.                O chamado ideal cristão

      O cristianismo não tem a pretensão de se apresentar, de fato, como uma filosofia, uma doutrina, mas sim, como uma religião, uma certa “sabedoria”, que com toda certeza pressupõe uma específica e particular concepção do mundo e da vida, ou seja, crer piamente em certezas é realmente mais fácil que se empenhar na solução do problema filosófico. Muito mais nos convêm ficar no ócio do que nos parece certo que no despertar apunhalado da dúvida. 
      O cristianismo tenta, buscar única e especificamente uma resposta – ainda que fragmentada para a existência do mal no mundo. Meta contra o qual Aurélio debalde se debateu contra a grande filosofia grega. Precisamente este mal, por que tem o poder de tornar – teoricamente inexplicável a realidade, e praticamente dolorosa a vida? Não é, por certo, o mal assim chamado metafísico, a saber, a necessária limitação de todo ser criado: porquanto esta limitação nada tira à perfeição dos vários seres a eles devida por natureza, mas apenas aquela plenitude do ser, que pertence unicamente a Deus, rigorosamente, isto é, teisticamente[7] concebido como transcendente e criador, pois esse gênero de mal, no teísmo, é plenamente explicável. 
            Nos resta, então, o mal, o chamado físico e moral, porquanto é limitação da natureza, verdadeira imperfeição de um determinado ser. O mal, físico e moral, é um problema, precisamente se se considerar a natureza específica do homem, a qual é a natureza do animal racional simbólico, o que não significa certamente lhe pertença a racionalidade pura, devida ao puro espírito; mas certamente exige a subordinação do sensível ao inteligível, do material ao espiritual. Isto significa exigir que os sentidos sejam instrumentos do intelecto e o instinto seja instrumento da vontade[8], naquele característico processo que é o conhecimento e a operação humana; exige que o corpo humano e a natureza em geral sejam submetidos às imposições do espírito, como deveria ser em uma hierarquia racional dos valores. 
            Ora, se se considerar, sem preconceitos, o indivíduo e a humanidade, a psicologia e a história, as coisas serão bem diferentes. Com efeito, demais vezes o sentido - do qual o conhecimento deve no entanto partir - sobrepuja o intelecto. E bem poucos homens e só com muitas dificuldades e não sem graves erros, chegam ao conhecimento daquelas verdades racionais - Deus, a alma, etc. - que são, entretanto, indispensáveis para uma solução humana do problema da vida. E, mais freqüentemente ainda, o instinto assenhoreia-se da vontade, e a maioria dos homens viveu e vive cegamente, contra as exigências da própria natureza racional, mesmo quando a verdade é conhecida pelo intelecto. 
            Este é o mal moral, espiritual, que domina o mundo humano. Pelo que diz respeito ao mal físico, a coisa é ainda mais patente: basta lembrar o sofrimento e a morte. Com isto, naturalmente, não se quer dizer que a impassibilidade e a imortalidade sejam uma exigência da natureza humana, como tal, mas unicamente se quer frisar que a dor e a morte - bem como a ignorância e a concupiscência - em sua atual intensidade, se evidenciam como um estado inatural com respeito ao nosso ser espiritual e racional, mas que, no entanto, na atual circunstância aparece como uma espécie de “segunda natureza”.
            Temos, pois, uma natureza, a natureza humana, que nos parece desordenada. A filosofia pretende conhecer a essência metafísica dessa natureza humana, deve reconhecer-lhe também a desordem, mas ignora-lhe a causa. A filosofia é certamente construtiva, metafísica; mas, chegada ao seu vértice, deve tornar-se crítica, isto é, deve reconhecer os próprios limites, porquanto não consegue resolver plenamente o seu problema, o problema da vida, precisamente por causa do mal. Não pode, todavia, renunciar absolutamente à solução deste problema, já que, desta maneira, comprometeria também a sua maior conquista: Deus. É antiga e famosa a objeção: de que modo concordar a absoluta sabedoria e poder de Deus com todo o mal que há no mundo, por ele criado? Deve-se entender, naturalmente, o mal físico e moral, e este propriamente em relação ao homem, que é dono da opção por este mal.
            Se a filosofia se mostra impotente para resolver em plenitude o seu próprio problema, há, porventura, outro meio a que pode o espírito humano razoavelmente recorrer para a solução de um problema tão premente? O cristianismo apresenta-se, especialmente como uma religião entre as religiões, a qual nos fala de uma queda do homem no começo de sua história, e afirma estar na verdade - bem como todo o sistema dos seus dogmas - como divinamente revelada. 
            A categoria singular do ser humano – que lhe distingue e eleva acima dos outros seres da criação visível - está dotado de inteligência e de vontade – criado à imagem e semelhança de Deus – com liberdade para tomar decisões. Mas, sendo criatura e não criador, sua liberdade deve estar harmonizada com a de Deus e a de seus semelhantes. Isto é o que fazem os mandamentos, que são caminhos de liberdade, colocando ordem no exercício da liberdade da criatura, liberdade esta que não significa fazer o que se quer[9], mas sim, ter o direito de escolher o que se quer fazer de modo que se esteja fazendo uso da verdadeira liberdade, harmonizada e ordenada com a liberdade dos demais.
            Conseqüentemente, se existe um mandamento legítimo, o ser humano tem a obrigação de cumpri-lo e não é moralmente livre, mesmo que seja possuidor de liberdade psicológica e física; se não existe mandamento, é muito livre de tomar a decisão que desejar. Assim, o ser humano tem que educar sua liberdade para utiliza-lá corretamente; quer dizer, tem que agir como ser humano, exercitando a inteligência e a vontade, mas referidas a uma norma objetiva e transcendente que dirige e regula sua conduta.
            A moralidade, pois, é uma qualidade do ato humano livremente exercido; e será positiva – boa – se puder ajustar-se à norma que o ordena como ser racional; será negativa – má – se atua irracionalmente contra a norma.
           Na experiência mais elementar do ser humano se produz um fenômeno que convém assinalar: sabe que faz o bem ou que age mal, que suas ações são boas ou más. Como é capaz de saber isso? É sua consciência quem o diz, essa voz interior que avisa: é preciso fazer o bem e evitar o mal. Mas a consciência não faz mais que traduzir a convicção prévia de uma lei que temos gravada profundamente, à qual devemos nos submeter; de modo que, se agimos de acordo com ela, agimos bem; e se a contradizemos, agimos mal.
            Com a finalidade de ter em mãos um critério claro e simples, a moralidade depende do objeto, o fim e as circunstâncias:
a) O objeto escolhido, que é o bem para o qual tende a vontade, podendo dizer-se que é a matéria do ato humano. É que há coisas que são boas por si mesmas e coisas que são más por si mesmas, ou seja, sempre. Por exemplo, tirar a vida a um inocente sempre será um crime, mesmo quando se queira dissimular com eufemismos hipócritas; pelo contrário, adorar a Deus é um ato humano bom em si mesmo.
b) O fim ou a intenção do ato pode modificar a moralidade, porque a ação boa em si, mas realizada com má intenção perverte aquela ação e a converte em má, como sentencia o princípio que diz “o fim justifica os meios”.
c) As circunstâncias, por último, também influem na moralidade agravando ou diminuindo a qualidade boa ou má de um ato; e afirmando com claridade que o que é mau não pode voltar a ser bom, sejam quais forem as circunstâncias.
           Portanto, para que um ato seja moralmente bom é preciso que seja bom o objeto, o fim e as circunstâncias; se é má alguma destas três coisas, o ato é mau. Erraria, pois, quem julgasse da moralidade dos atos humanos considerando tão somente a intenção que os inspira, ou as circunstâncias (ambiente, pressão social, coação ou necessidade de agir, etc). Há atos que – por si e em si, independentemente das circunstâncias e da intenção – são gravemente ilícitos por razão de seu objeto; por isso a moral afirma rotundamente que nunca está permitido fazer o mal para se obter um bem.
           No ser humano existe ainda uma série de impulsos, tendências, afetos e sentimentos, que são conhecidos pelo termo “paixões”, reconhecidas como forças que Deus colocou na natureza humana e que nos movem a agir. Como conseqüência do pecado original, estas forças estão desordenadas e provocam tensão no ser humano, mas é indubitável sua utilidade quando se consegue controlá-las. São como a água: represada e dirigida é fonte de vida e de energia; se rompe a represa, provoca a catástrofe.
            O amor e o ódio, o desejo e o temor, a alegria, a tristeza e a ira, são as paixões principais[10]. As paixões de que por si não são boas nem más, mas o são na medida em que dependem da razão e da vontade e impulsionam a agir bem ou mal. Assim, as paixões são moralmente boas quando contribuem a uma ação boa, e são moralmente más se puxam a agir mal. As paixões podem ser assumidas nas virtudes e pervertidas nos vícios.
           Não é fácil dominar as paixões[11], submetendo-as à razão com uma liberdade forte e ordenada, mas é necessário fazê-lo se queremos viver com a dignidade que comporta a condição humana e sobretudo a dignidade de cristãos, que se sabem filhos de Deus. Faz falta querer e lutar, e é necessário, antes de tudo, a graça de Deus, que o Espírito Santo proporciona em abundância aos que a pedem. Assim, é possível conseguir que nosso comportamento – todos os atos – seja bom porque o objeto, o fim e as circunstâncias sejam bons, apesar das paixões, ou melhor, dominando as paixões e não deixando-nos arrastar por elas.

2.2.               O livre arbítrio: dom de Deus?
“ Agostinho parece pensar em Deus como sempre querendo dar graça a quem a quiser, seja na forma de conhecimento, seja na de fortalecimento da vontade para o bem”.[12]

            Claramente a Moral agostiniana é teísta e cristã. Logo transcendente e ascética. Característica fundamental da moral Agostiniana é o voluntarismo não determinado pelo intelecto, mas precedente a este. A vontade é livre, e pode querer o mal, pois é um ser limitado, podendo agir desordenadamente, literalmente, contra até mesmo os preceitos de um Deus.
            E deve-se considerar não causa eficiente, mas deficiente da sua ação viciosa, porquanto o mal não tem realidade metafísica. O pecado, pois, tem em si mesmo imanente a pena da sua desordem, porquanto a criatura, não podendo lesar a Deus, prejudica a si mesma, determinando a dilaceração da sua natureza. A fórmula agostiniana em torno da liberdade em Adão - antes do pecado original - é: poder não pecar; depois do pecado original é: não poder não pecar; nos bem-aventurados será: não poder pecar. A vontade humana, portanto, já é impotente sem a graça. O problema da graça - que tanto preocupa Santo Agostinho - tem, além de um interesse teológico, também um interesse filosófico, porquanto se trata de conciliar a causalidade absoluta de Deus com o livre arbítrio do homem. Como é sabido, Santo Agostinho, para salvar o primeiro elemento, tende a descurar o segundo. 
            Santo Agostinho distinguira entre livre arbítrio e liberdade, atribuindo ao livre arbítrio a capacidade de eleger um determinado propósito, seja bom ou mau, mas a liberdade é algo diferente, pois radica no bom uso do livre arbítrio. Ora, dada a corrupção da nossa natureza produzida pelo pecado, o bom uso do livre abítrio ou liberdade, não pode dar-se sem a intervenção divina.



2.4.               O peso que trazemos acerca da sexualidade: o pecado como o conhecemos

            Continência sexual, jejuns, peregrinações, messianismo, celibato e virgindade. Origens moralistas e teológicas, porém empobrecidas, que ainda hoje regem a sociedade ocidental.[13]
            Não satisfeito com o dom das letras e com uma espantosa facilidade de comunicação, que o colocou entre os imortais da literatura mundial, Aurélio deu início, logo depois, provavelmente em 401, à redação de uma leitura própria, muito sua, do real significado do Gênesis - De Genesi ad Litteram - na qual ainda demorou-se uns quinze anos. O que já havia esboçado nas "Confissões" então tomou corpo. Foi com Aurélio que a questão tornou-se dominante, reveladora da sua idéia do homem e da humanidade da qual o cristianismo, até os nossos dias, teima em não abandonar. 
            O sexo para o cristão, problema que enfrentavam os pregadores da nova fé era em relação ao casamento: como conseguir manter um dos princípios básicos do cristianismo aceitos na forma do "crescei e multiplicai-vos"[14] sem considerar a atração ou o prazer sexual?
            Tentado resolver esse conflito Aurélio, terminou por gerar sua doutrina sobre o casamento, o sexo e a privação carnal. Donde viria, indagava ele, essa miséria que nos cerca, essa corrupção[15], essas heresias e a crassa maldade? Existia na sociedade, concluiu ele, uma mancha inapagável motivada pelo pecado original advindo do impulso sexual – das paixões desordenadas – , que atormentava o homem até a morte. Essa era a maldição que acompanhava Adão e Eva e seus descendentes desde a queda do Paraíso. 
            Para Santo Agostinho, na situação paradisíaca não havia tensão entre o impulso e o ato sexual. Foi a partir da danação dos nossos pais primevos que essa desgraça começou. Parecia-lhe que o casamento, a relação sexual e o Paraíso eram tão incompatíveis como o Paraíso e a Morte. Desse modo, a sexualidade permanecia como o indicador da queda do homem, do seu triste declínio da anterior situação angelical, fazendo com que deslizasse para baixo, para a natureza física, e desta para a sepultura. Está certo que os casais deveriam preocupar-se em gestar filhos, mas que o fizessem conscientes de que estavam cometendo um ato de rebaixamento. Era algo necessário mas humilhante, que deveria ser praticado sob os acordes de uma intensa melancolia.
            Foi contra isso que mobilizou-se seu rival, Juliano, bispo de Eclanum que, depois de 418, embrenhou-se numa ruidosa polêmica com ele. Juliano mostrou-se indignado com as acusações de Aurélio ao sexo contra o casamento. Não podia conceber, explicou ele, que o ato necessário à nossa reprodução fosse algo demoníaco ou ter que ser praticado sobre o véu da vergonha e do enxovalhamento.
             Afinal, eram "impulsos do nosso corpo feito por Deus". O prazer era necessário à reprodução, era a força que fundia as sementes masculinas e femininas num amplo “calor genitalis”, útil a que ocorresse uma conjunção saudável e feliz. Nada poderia haver de sinistro numa relação sexual bem realizada e completa. Bem ao contrário, viu-a natural, saudável, como "o instrumento de eleição de qualquer casamento.... merecedor de censura apenas em seus excessos." 
            Santo Agostinho em várias cartas da sua imensa correspondência tentou amenizar as objeções de Juliano, procurando mostrar-se menos radical do que nos seus escritos anteriores. Porém, sabe-se que, para a posteridade, foi essa sua visão trágica da existência - de sermos os infelizes portadores perpétuos do pecado original, que irá marcar de uma maneira definitiva o cristianismo. E o sexo ficou, dali para sempre, visto como uma transgressão, como uma obscenidade - Esta versão é equivocada justamente porque Aurélio prega a sexualidade em uma orientação para o bem, exercício do puro amor. Neste sentido a visão de Juliano do que Aurélio escreve é reducionista, pois a meu ver Juliano se preocupa com a razão instrumental  (a utilidade da sexualidade ou do prazer no exercício da sexualidade que é na verdade uma das dimensões da sexualidade pregada por Aurélio), enquanto a grande preocupação de Aurélio é com o que está para além do físico; uma abordagem muito mais completa do que realmente impulsiona o espírito humano, frente ao exercício de sua liberdade.... quiçá um ardil satânico para atormentar infinitamente a existência humana, até pelo menos o surgimento da psicanálise de Sigmund Freud, no século XX, que aboliu, pelos menos entre as elites ocidentais, a idéia do pecado.
            Polêmica encontrada e detalhada num dos capítulos, o 19º, do notável livro "Corpo e Sociedade" (The Body and Society", Jorge Zahar Editores, RJ.1990) de Peter Brown, um dos maiores historiadores da era clássica e professor da Universidade de Princetown, sendo o exposto acima apenas uma reduzida amostra da magistral reconstrução feita por ele da polêmica sobre a sexualidade nos tempos do cristianismo chamado primitivo, visto pelos seus apóstolos e seguidores, como Tertuliano, Orígenes, Cipriano, Mani e João Clímaco, Ambrósio, Jerônimo e tantos outros.
            Se a filosofia é impotente para resolver plenamente o seu próprio problema, há, porventura, outro meio a que pode o espírito humano razoavelmente recorrer para a solução de um problema tão premente? Apresenta-se a religião, e especialmente uma religião entre as religiões, a qual nos fala de uma queda do homem no começo de sua história, e afirma esta verdade - bem como todo o sistema dos seus dogmas - como divinamente revelada. 
            Quanto à possibilidade de uma queda do espírito, em geral, isto é, quanto à possibilidade do mal moral, do pecado, basta lembrar que o ser criado pode, por sua natureza, desviar-se da ordem: porquanto há nele algo de não-ser, de potência, precisamente pelo fato de ser ele um ser criado. E o livre arbítrio proporciona-lhe o modo de realizar essa possibilidade, a saber, proporciona-lhe o modo de desviar-se efetivamente do ser, da racionalidade, enveredando pelo não-ser, pela irracionalidade. Quanto à realidade de uma queda original do homem, remetemos ao fato da Revelação em que é contida. 
            Da Escritura e da Tradição, garantidas pela interpretação da Igreja e sistematizadas pela teologia, evidencia-se, fundamentalmente, como o homem primigênio não só teria possuído aquela harmonia natural, de que agora é privado, mas teria sido outrossim elevado, como que por nova criação, à ordem sobrenatural, com um conveniente conjunto de dons preternaturais. Noutras palavras, o homem teria participado - com uma natureza extraordinariamente dotada - da vida de Deus, teria gozado de uma espécie de deificação[16], não por direito, mas por graça. E evidencia-se também que - devido a uma culpa de orgulho contra Deus, cometida pelo primeiro homem, do qual, pela natureza humana, devia descender toda a humanidade - teria o homem perdido aquela harmonia e a dignidade sobrenatural, juntamente com os dons conexos. 
            Há, portanto, uma enfermidade, uma debilitação espiritual e física na natureza humana, essencial desde o nosso nascimento, e que, por conseguinte, é herdada. Basta, por exemplo, lembrar como, pela lei da hereditariedade, se podem transmitir deficiências materiais e, por conseqüência, também morais: deficiências que não dependem dos indivíduos, visto que eles as sofrem. O pecado original, pois - que importa na privação da ordem sobrenatural, isto é, na privação do único fim humano efetivo, até ao sofrimento e à concupiscência, quer dizer, até à vulneração da própria natureza - voluntário e culpado em Adão, seria culpado em seus descendentes, enquanto não quiserem servir-se das misérias provindas do pecado original como estímulo para a Redenção, deixando-se praticar o Cristianismo, ingressando na Igreja. 
            O aspecto da condição primitiva do homem, concernente à elevação sobrenatural, por mais supereminente e central que seja no cristianismo, aqui não interessa. Com efeito, a elevação à ordem sobrenatural sendo, por definição, gratuita, isto é, não devida à natureza humana, bem como a nenhuma natureza criada, a privação da mesma, provinda do pecado, não podia causar vulneração em a natureza humana, nem a perda dos dons praternaturais. E, logo, não podia suscitar o problema do mal, que temos considerado insolúvel pela filosofia. 
      É com toda certeza fascinante notar como as discussões e idéias acerca da sexualidade sempre estiveram nos embates teológicos cristãos. A humanidade, após o pecado de Adão e Eva, deveria pensar o que fazer com a maldição do sexo-fogo-ardor que mantinha a sociedade viva, porém distante de Deus na opinião moralizada de parte da Igreja cristã. 

2.5.              O desejo da carne é visto por Santo Agostinho como pecado?

            Impressionados pela liberalidade sexual e vocação orgiástica da elite romana, ainda majoritariamente não-cristã, os apologistas[17] daqueles primeiros tempos fizeram questão de manter uma marcada distância em relação aos deuses e ritos pagãos e, inspirados pelos solitários "homens do deserto", eremitas e anacoretas[18], inauguraram uma política de completo repúdio ao sexo. Esse radicalismo - enfatizado pelas epístolas Paulinas - acentuou-se pela prática da abstinência carnal, transformando-se num atrativo tão forte para novos seguidores como o martírio dos crentes nas arenas romanas. Enquanto estes davam suas entranhas para as feras devorarem, outros abandonavam as práticas sexuais para sempre: o martírio e a castidade eram faces diferentes da mesma moeda.
      Havia muito simbolismo atrás disso tudo. Não só a busca da perfeição atrás do "coração simples", mas uma nova visão do ser humano, na qual ele somente poderia manter-se no frescor com que saiu das mãos do criador permanecendo puro ou intocado. Sendo igualmente - por meio da propaganda do ascetismo - uma forma peculiar de manifestar abertamente seu protesto e desprezo pela época em que viviam, por sua excessiva conscupsciência, sua impiedade, libertinagem e crueldade pagã.
      Para Santo Agostinho há uma distinção clara entre os termos ‘livre-arbítrio’ -“liberum arbitrium” e liberdade - “libertas”. Esta distinção responde ao problema do mal no mundo. O homem pelo uso do livre-arbítrio, que é um bem, escolhe afastar-se de Deus e perde sua liberdade. O homem após a queda é um homem sem poderes, sem liberdade e somente poderá recuperá-la e tê-la plenamente com a ajuda da graça. A graça restabelecerá este poder que fora perdido com o pecado. Vemos assim três momentos do homem: num primeiro, o homem no paraíso goza tanto de seu livre-arbítrio quanto de sua liberdade; num segundo ele, através do livre-arbítrio, peca e uma das conseqüências é a perda da liberdade; e, em terceiro, o homem com a ajuda da graça recupera o uso pleno da liberdade. Pascal concebe o primeiro estado do homem da mesma forma que Aurélio. Mas depois da queda, para Pascal, a situação do homem torna-se irremediável e, ao que tudo indica, o homem deixa de possuir não apenas a liberdade mas também o livre-arbítrio. O homem tem agora uma “vontade depravada” que está inscrita na natureza. De forma a ser a vontade também determinada por causas anteriores a ela. O homem decaído não possui domínio sobre sua vontade, nem sobre a razão e tampouco domina suas paixões.


3. DIGNIDADE E CONSTRUÇÃO CRISTÃ DO OCIDENTE

            Santo Agostinho constitui-se como base para o principio da dignidade da pessoa humana. Assim, cumpre ressaltar sua filosofia cristã, que se mostra de extrema relevância para a idealização do princípio da dignidade da pessoa humana.
            É a dialética cristã entre preceitos da fé, tais como alma, espírito e livre-arbítrio que permitiu a criação de uma doutrina que se preocupa com o homem enquanto fim em si mesmo, sujeito de direitos e merecedor de respeito e dignidade. Tal criação serviria posteriormente para uma elaboração mais pormenorizada de dignidade da pessoa humana, tema que seria abordado pelo filósofo Immanuel Kant durante a segunda metade do século XIX.[19]
Como se vê, esta conversação temática entre a alma, o livre-arbítrio e a justiça é tratada por Santo Agostinho, em sua obra “O livre arbítrio”:







"Se o homem carecesse de livre-arbítrio da vontade, como poderia existir esse bem, que consiste em manifestar a justiça, condenando os pecados e premiando as boas ações? Visto que a conduta desse homem não seria pecado nem boa ação, caso não fosse voluntária. Igualmente o castigo, como a recompensa, seria injusto, se o homem não fosse dotado de vontade livre. Ora, era preciso que a justiça estivesse presente no castigo e na recompensa, porque aí está um dos bens cuja a fonte é Deus. Conclusão, era necessário que Deus desse ao homem vontade livre"[20]

Santo Agostinho trabalha brilhantemente a questão do livre-arbítrio, ao defender que a alma errática (aquela que comete atos contrários à moral cristã), após a sua criação, e após o pecado original, distante de Deus, possui como parâmetro para sua conduta e comportamento nada mais, nada menos que a lei que se encontra inscrita em seu coração (lei divina), e será o livre-arbítrio que facultará à mesma escolher e decidir entre comportamentos conformes ou desconformes aos preceitos de ordenação do universo.[21]
Segundo este doutrinador – Santo Agostinho, o homem, enquanto sujeito passivo e ativo de direitos e deveres é capaz de escolher livremente como agir. É o ser humano, enquanto ente dotado de razão, que dará rumo à sua própria existência e optará por seguir a Lei Divina, ou a Lei Humana.
Essa noção de livre-arbítrio como autodeterminação da alma por si mesma fica clara no diálogo em que Agostinho defronta-se com Evodius (De libero arbítrio, I, 1) “dizendo que as más ações não seriam punidas justamente se não tivessem sido cometidas voluntariamente, ou seja, se as punições não tombassem sobre homens capazes de decidir, de fazer, de se conduzir de acordo com o bem ou o mal, não haveria aí justiça nenhuma.” [22]


4. CONSIDERAÇÕES FINAIS


            Podemos dizer que a filosofia e o pensamento cristãos foram de extrema importância para a concepção do princípio da dignidade da pessoa humana conforme existe hoje.
Nas ponderações feitas por Santo Agostinho, a doutrina cristã buscou, durante a Idade Média, se preocupar com valores intrínsecos ao ser humano, quais sejam, a igualdade, o livre-arbítrio e a existência de uma lei natural (ou lei Divina) que se sobreponha a qualquer mandamento legal positivado em uma norma.
            Este trabalho me ajudou a entender o pensamento – e mais que isso a experiência de vida de Santo Agostinho frente a suas paixões – no sentido mais agostiniano possível do emprego da palavra.




“Agostinho é único pela sua riqueza, único pela sua lucidez de pesamento, único pela profundidade de humana experiência, único pela sua atualidade! Se Agostinho vice hoje, falaria como falou há mais de mil anos, porque ele personifica verdadeiramente a humanidade que crê, que ama a Cristo e a nosso Deus bendito”[23].

A partir de uma análise histórica de seu pensamento quanto à sexualidade humana, o esclarecimento de suas discórdias de pagão a convertido e o linear das influências que seu pensamento exerce especialmente no ocidente, me ajudaram a perceber que este, acolhe com grande vigor, amplitude e deleite o corpo e suas limitações frente o criador.
É um pensador que reflete para além de seu tempo e não se esgotando me inflama cada vez mais, fazendo com que eu possa arder de paixão por este e outros temas que merecem pesquisa com maior empenho. Fico grato por ter a graça de conhecer um pouco do pensamento de quem ponha realmente em Deus almejando ser somente humano.
            Diz-se aqui que, sem o pensamento cristão e os ideais do filósofo cristão, provavelmente o princípio positivado no artigo 1º, III da Constituição Federal da República de 1988 não seria encabeçado como hoje por diversos hermeneutas[24] e operadores do Direito em todo o território nacional.
            Santo Agostinho se mostra Terênciano[25], pois a sexualidade a positivação do principio da dignidade humana, intenta o poema de Terêncio: "Homo sum: nihil humani a me alienum puto".[26] (Sou homem: nada do que é humano me é estranho.)
 Resumen:

               Se trata además de escribir presentación oral en el Primer Simposio Internacional de Filosofía de la dignidad humana. Se trata de San Agustín, este "gran" que la confesión - en el doble sentido de que América da el término: confesamos nuestra propia miseria y confesar la grandeza de la misericordia divina - dice con convicción: "No, la felicidad no es un órgano y por lo tanto no se ve con los ojos "[27]. Las pasiones que, Agustín dio a los jóvenes son ilusorias. Dios es el único "ser" capaz de satisfacer las exigencias del espíritu humano para él.

              En estas cuestiones, en el análisis y la contextualización de Agustín, y sobre todo uno de los grandes arquitectos del proyecto intelectual de la Iglesia Católica, traído a tales demandas, una cierta "chivo expiatorio" que define el contenido de la cristiandad católica en los siguientes siglos Occidente. Por lo menos en la forma en que fue interpretada por los comentaristas medievales. Este artículo tiene como objetivo establecer las directrices que relacionan el pensamiento cristiano sobre la sexualidad humana, con la construcción de uno de los principios constitucionales más importantes de la era moderna: el principio de la dignidad humana.


Palabras clave: Sexualidad, San Agustín, la dignidad humana, Oeste.

Enviado em 01 de dezembro de 2016.
Aceito em 04 de dezembro de 2016.




                                                                      
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[1] Graduado em Filosofia (bacharel licenciado) PUC-MG (2005), Pós-graduado em Fé e Política (lato sensu) PUC-RJ (2007), mestrando em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (inicio em 2017). 
[2] Cf. Confissões. XII.

[3] “Os seres humanos optam voluntariamente por viver em grupos e constituem sobre si Estados cuja função é ordenar a convivência coletiva e pacificar os litígios. Conforme as coletividades evoluem, direitos são reconhecidos e criados, e a complexidade das relações cresce exponencialmente. Dentre os direitos essenciais está a dignidade da pessoa humana, um valor fundamental constitucional que norteia todas as atividades realizadas nos âmbitos nacional e internacional e sem o qual a convivência em coletividade se tornaria inviável. Até o presente momento inúmeros autores buscaram identificar o que seria a dignidade da pessoa humana, entretanto, todos se limitaram a uma identificação externa, baseada em exemplos - deveras insuficiente, razão pela qual muitos dizem que o referido do instituto não teria como possuir uma definição adequada.” Santo Agostinho nos oferece um objetivo -  é formar uma definição mais completa e adequada sobre o que seria o princípio da dignidade da pessoa humana. (MOTTA, Artur Francisco Mori Rodrigues. A dignidade da pessoa humana e sua definição. Acesso em: 05/12/2016. < http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_ id=14054.>).


[4] O nome clássico e ordinário era de ações impudicas, ações que, de outro lado, podem ser boas, meritórias e limpas, mas que assim se designavam em sentido pejorativo. AZPITARTE, Eduardo López. Ética da Sexualidade e do Matrimônio. São Paulo: Paulus, 1997. – (Nova práxis cristã). p. 113.
[5] Ontologia significa “estudo do ser” e consiste em uma parte da filosofia que estuda a natureza do ser, a existência e a realidade.
A palavra é formada através dos termos gregos ontos (ser) e logos (estudo, discurso). Engloba algumas questões abstratas como a existência de determinadas entidades, o que se pode dizer que existe, qual o significado do ser, etc.
Os filósofos da Grécia Antiga Platão e Aristóteles estudaram o conceito que muitas vezes se confunde com metafísica. Na verdade, a ontologia é um aspecto da metafísica que procura categorizar o que é essencial e fundamental em determinada entidade.
Este termo foi popularizado graças ao filósofo alemão Christian Wolff, que definiu a ontologia como philosophia prima (filosofia primeira) ou ciência do ser enquanto ser. Assim, esta ciência tinha um caráter racional e dedutivo, que tinha como objetivo estudar os traços mais gerais do ser.
No século XIX, a ontologia foi transformada por neoescolásticos na primeira ciência racional que abordava os gêneros supremos do ser. A corrente filosófica conhecida como idealismo alemão, de Hegel, partiu da ideia de autoconsciência para recuperar a ontologia como "lógica do ser".
No século XX, a ligação entre ontologia e metafísica geral deu lugar a novos conceitos, como o de Husserl, que vê a ontologia como ciência formal e material das essências. Para Heidegger, a ontologia fundamental é o primeiro passo para a metafísica da existência.
A “prova ontológica” é uma das provas clássicas sobre a existência de Deus, que indica que se a mente humana pondera a existência de um ser perfeito, esse ser deve existir, pois a existência é um requisito de todos os seres. Assim, ao contemplar Deus como um ser perfeito e infinito, a sua existência é comprovada.
[6] Texto de Emelly Tainara Schnorr, publicado pelo Instituto Filosófico-Teológico Santa Escolástica, disponível em http://ifte.blog.arautos.org/2011/03/fundamento-da-dignidade-humana/.
[7] Teísmo é um conceito surgido no século XVII (R. Cudworth1678) contrapondo-se ao moderno ateísmodeísmo e panteísmo. O teísmo sustenta a existência de um deus (contra o ateísmo), ser absoluto transcendental (contra o panteísmo), pessoal, vivo, que atua no mundo através de sua providência e o mantém (contra o deísmo). No teísmo a existência de um deus pode ser provada pela razão, prescindindo da revelação; mas não a nega. (Cudworth, Ralph (1617-1688). The true intellectual system of the universe: the first part, wherein all the reason and philosophy of atheism is confuted and its impossibility demonstrated. London: Printed for R.Royston, 1678).
[8] “Agustín es el primer autor del Occidente latino que desarrolla un concepo de la volundad y que senel lugar destacado del mismo como instrumento filosófico de descubrimiento en su reflexión acerca del cristianismo” (Dihle 1982, 123) . FITZGERALD, Allan. Diccionario de San Agustín: San Agustín através del tiempo. Burgos: Mont Carmelo, 2001. p. 1338. 1º coluna.
[9] Cf. Confissões II, 3. p. 
[10] Cf. Confissões. X, 22. p. 281.
[11] Cf. Confissões. II, 1. p.45-46, 61.
[12] PICH, Roberto Hofmaster. In: O enigma da liberdade (Cult). p. 54.
[13] BROWN, Peter. Corpo e Sociedade: O homem, a mulher e a renúncia sexual no início do cristianismo. p. 318 – 367.
[14] Cf. Gênesis. BÍBLIA DE JERUSALÉM. Tradução das introduções e notas de La Sainte Bible, edicção de 1973, publicada sob direção da “École Biblique de Jérusalem”. São Paulo: Paulinas. 1 de jan. de 1981.
[15] A. G. Cunha. Índice do Vocabulário do Português Medieval. Fundação Casa de Rui Barbosa. Vol. 1 [A] Rio de Janeiro, 1986. - Vol. 2 [B-C] 1988. - Vol. 3 [D] 1994 -- suplemento [A-C] (in Confluência Revista do Instituto de Língua Portuguesa e do Liceu Literário Português, no 3, separata, Rio de Janeiro, 1992) [No fichário (FichIVPM), arquivado na Fundação Casa de Rui Barbosa, estão incluidas cerca de 170.000 fichas datilografadas com a transcrição das passagens que documentam os vocábulos medievais, incluídos naturalmente os que se iniciam pelas letras E, F, G ... V, X, Z]. HOUAISS, Instituto Antônio. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
[16] Atribuir-se natureza divina; endeusar (-se), divinizar (-se),  manifestar adoração ou reverência a; cultuar.

[17] Recebem esta denominação os pensadores cristãos dos séculos II e III d.C., que se dedicavam à tarefa de escrever apologias do cristianismo. Era preciso, nessa época, defender a nascente doutrina cristã de três correntes distintas que lhe faziam oposição: a religião judaica, o Estado romano e a filosofia pagã. Contra os judeus, era necessário afirmar argumentativamente o messianismo de Jesus Cristo. Contra os romanos, era preciso convencer o imperador do direito de legalização à prática do cristianismo dentro do Império. E contra os filósofos pagãos, a tarefa dos apologistas era a de apresentar a religião cristã como uma verdade total, à diferença dos erros ou verdades parciais presentes, segundo estes autores, na filosofia helenística. Contudo, a educação praticada nesta época era feita, principalmente, nos moldes das escolas filosóficas dominantes no período greco-romano, especialmente das escolas estóicas e platônicas. Uma vez que os apologistas, em sua maioria, eram homens cultos, eles se haviam formado dentro dos padrões da filosofia pagã. Desse modo, seu discurso se encontrava calcado na filosofia antiga, tanto desde a perspectiva dos argumentos utilizados em defesa do cristianismo quanto na tentativa de conciliar sua mensagem com as verdades presentes naquela filosofia. Se as verdades da filosofia pagã são verdades parciais, somente o cristianismo pode resgatá-las, integrando-as em um sistema completo, regido pela verdade suprema da Revelação. A doutrina cristã somente pôde ganhar universalidade em sua época através deste diálogo com a filosofia helênica, uma vez que esta se encontrava disseminada por todo o mundo antigo. Assim, a utilização de seus argumentos e vocabulário garantiu uma ampliação do poder de comunicabilidade das verdades cristãs. Dentre os apologistas, podem ser apontados alguns de seus mais importantes representantes: Aristides, São Justino, Minucio Félix, Tertuliano, Quadrato, Taciano, Atenágoras, Arnóbio e Lactâncio. Através do pensamento dos apologistas, foi lançada a base para que se pudesse precisar tematicamente os dogmas presentes na religião cristã, e, conseqüentemente, para a formação de um vocabulário filosófico integrado à investigação teológica. Desta forma, seus escritos influíram de maneira determinante no pensamento teológico-filosófico, predominante durante toda a Idade Média. (Reale, Giovanni.- "História da Filosofia Antiga" Vol. II Edições Loyola, São Paulo, s/d. Reale, Giovanni & Antiseri, Dario.- "História da Filosofia" Vol. II Ed. Paulus, São Paulo, 1990).

[18] Na história da Igreja dos primeiros séculos, assim se chamavam os fiéis que, por motivos espirituais, passavam a viver em lugares isolados: “reclusos” em ruínas, “estilitas” em cima de colunas ou “*eremitas” em celas isoladas (eremitérios). Mais tarde o anacoretismo cedeu lugar ao *cenobitismo. 
[19] SALGADO, Karine. A filosofia da Dignidade Humana – A contribuição do alto medievo. Belo Horizonte: Mandamentos, 2009. e SALGADO, Karine.. A filosofia da Dignidade Humana – Por que a essência não chegou
ao conceito? Belo Horizonte: Mandamentos, 2011.
[20] SANTO, Agostinho, O livre arbítrio, p. II, 1, 3.
[21] De civitate Dei, Liv. XX, Part. I: sed etiam de singulorum operibus propiis, quae gerunt arbítrio voluntatis.
[22] C.B. Bittar, Eduardo e ASSIS DE ALMEIDA, Eduardo, Curso de Filosofia do Direito, pg. 246, item 9.4.
[23] Paulo VI às irmãs agostinianas, 3 de novembro de 1973. In: LUCAS, Miguel. Entrevista com Santo Agostinho: a caminho do novo milênio. São Paulo: Edições Loyola. 1997. p. 5-6.
[24] Hermenêutica é uma palavra com origem grega e significa a arte ou técnica de interpretar e explicar um texto ou discurso.
O seu sentido original estava relacionado com a Bíblia, sendo que neste caso consistia na compreensão das Escrituras, para compreender o sentido das palavras de Deus. Hermenêutica também está presente na filosofia e na área jurídica, cada uma com seu significado.
Segundo a filosofia, a hermenêutica aborda duas vertentes: a epistemológica, com a interpretação de textos e a ontológica, que remete para a interpretação de uma realidade.
Etimologicamente, a palavra está relacionada com o deus grego Hermes, que era um dos deuses da oratória.
[25] Públio Terêncio Afro, em latim Publius Terentius Afer (Cartago, ca. 195 a.C.-185 a.C.  Lago Estínfalo, ca. 159 a.C.), foi um dramaturgo e poetaromano, autor de pelo menos seis comédias: Andria (A moça de Andros), Hecyra (A Sogra), Heaautontimorumenos (O Punidor de Si Mesmo), Eunuchus (O Eunuco), Phormio (Formião) e Adelphoe (Os Dois Irmãos).
Terêncio nasceu na África Proconsular, em meados do ano 185 a.C. Foi vendido como escravo ao senadorTerêncio Lucano, que deu-lhe educação e, tempos depois, o libertou. Por ser muito amigo de Cipião, muitos atribuíram a esse último a autoria de várias comédias de Terêncio.
A obra de Terêncio é composta por pelo menos seis comédias que resistiram à ação do tempo chegando aos dias de hoje. São elas: "Andria", "Hécira (sogra em grego)", "Heautontimoroumenos (o que se pune a si próprio - em grego)", "O Eunuco", "Formião", "Os Adelfos (os irmãos)". Pouco apreciado pelo público romano, que preferia as farsas mais vivas e coloridas de Plauto, foi mais apreciado na Idade Média e na Renascença, sendo muito imitado até os tempos de Molière. Foi tão grande a preferência por Terêncio na Idade Média que suas peças eram representadas nos colégios e na Renascença foram traduzidas em várias línguas. Seus personagens pertencem em sua maioria às classes sociais mais altas. Suas obras são escritas em verso e seu estilo é "puro". Apesar disso, ele hoje é considerado um autor menor que seu contemporâneo Plauto.

[26] WIKIPEDIA. Disponível em: <https://pt.m.wikipedia.org/wiki/Terêncio>. Acesso em: 15 set. 2005. 

[27] Cf. Confesiones. XII.